
Autor: por Mauro Camargo
Ministro do STJ defende judiciário mais interativo e próximo da realidade do setor portuário
Em evento em Santos, Sérgio Kukina destacou a importância do diálogo para a harmonia entre portos e cidades, e a evolução do papel do magistrado na construção de um futuro justo e sustentável
DIREITO PORTUÁRIO
O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Sérgio Kukina, participou de um painel sobre sustentabilidade, onde discutiu o papel do Poder Judiciário frente às complexidades do setor portuário e às prementes questões ambientais. O painel integrou a programação do Congresso Nacional Portuário, realizado pela Autoridade Portuária de Santos, em parceria com a Academia Brasileira de Formação e Pesquisa (ABFP), nos dias 5 e 6 de junho, em Santos.
O ministro enfatizou a necessidade de um Judiciário que transcenda sua função tradicionalmente reativa, buscando o diálogo e uma compreensão aprofundada da realidade dos setores sobre os quais decide, como forma de fomentar soluções consensuais e uma atuação mais eficaz e socialmente relevante.
Kukina argumentou que, apesar da concepção clássica do Judiciário como uma "última instância" ou "soldado de reserva", a crescente complexidade do ecossistema portuário e as rápidas transformações sociais e tecnológicas exigem dos magistrados uma postura mais participativa e interativa. Esta nova abordagem implica engajamento em debates setoriais, aquisição de conhecimento prático sobre as áreas de litígio e um esforço contínuo para conciliar o desenvolvimento da atividade portuária com o bem-estar das comunidades e a preservação ambiental.
Sustentabilidade é uma pauta absolutamente prioritária, sobretudo para o Poder Judiciário, declarou o ministro, sinalizando a crescente atenção da Justiça às questões ambientais, sociais e de governança (ESG) no contexto das atividades econômicas.
A participação de Kukina visou, segundo ele, trazer exatamente algumas dessas noções que envolvem a atuação do Poder Judiciário na temática relativa ao direito portuário em seu mais amplo espectro, passando também pelo aspecto da sustentabilidade.
O ministro detalhou a multifacetada natureza do setor portuário, que engloba a questão socioambiental, a questão da mobilidade urbana e todo o impacto ambiental que a atividade causa nas cidades do entorno e na própria região marítima.
Dada essa complexidade, Kukina ressaltou a importância de uma relação harmoniosa entre as operações portuárias e as cidades que as abrigam. "O que não se pode perder de vista, exatamente, é a impossibilidade de se permitir que não haja um diálogo virtuoso entre a atividade portuária e o seu entorno, o porto e a cidade. Tem que haver uma interação para que esses dois segmentos convivam em harmonia, o porto servindo a cidade, a cidade vendo o porto como parceiro", ponderou.
Questionado sobre o papel do Judiciário na facilitação dessa harmonia, o ministro reiterou a função primordial da justiça como mediadora de conflitos quando o consenso falha. "O Judiciário quer estar sempre como última instância, preferencialmente. Sempre aguardamos que os atores presentes nesse contexto possam, por si sós, chegar à melhor solução diante das controvérsias que surgem. O Judiciário atuará, portanto, sempre como um soldado de reserva. Alguém que falará quando, lamentavelmente, não haja mais despacho para o consenso, mas sempre que provocado, obviamente, daremos nossa posição."
O ministro do STJ reconheceu que o Judiciário, até então considerado “estático”, em função da revolução tecnológica se mostra mais proativo, se aproximando as demandas apresentadas.
Essa nova percepção se traduz em uma maior disposição para o diálogo e a interação. Ele pode agir e interagir fora da 'agenda certa', seja dialogando com os atores envolvidos nos diversos segmentos de interesse, explicou o ministro. Exemplificando com o próprio STJ, ele mencionou a importância de "podermos conversar, seja em ambiente acadêmico, eventos como esse que hoje acontece aqui em Santos, podermos dialogar com os atores do sistema, com os atores públicos do âmbito da regulação e do mercado em si."
Essa abertura, segundo Kukina, não exime o Judiciário de sua responsabilidade: ele é necessariamente provocado, mas isso não nos exime de, de algum modo, nos pronunciarmos a respeito de uma questão que é crucial para a sociedade." Assim, observa-se um movimento para "sair dessa posição absolutamente estática e histórica para hoje interagirmos com o mundo que nos rodeia.
Para Kukina, é imperativo que o julgador tenha contato direto com os contextos sobre os quais decide. É preciso que ele conheça, palpe e percorra os espaços da vida real. Só assim ele terá também melhores condições de julgar. O julgador precisa reconhecer que ele também pertence a essas relações sociais que se expressam nos mais diversos espaços da vida.
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